terça-feira, 7 de setembro de 2010

A Alegria na Tristeza

O título desse texto na verdade não é meu, e sim de um poema do uruguaio Mario Benedetti. No original, chama-se "Alegría de la tristeza" e está no livro "La vida ese paréntesis" que, até onde sei, permanece inédito no Brasil.

O poema diz que a gente pode entristecer-se por vários motivos ou por nenhum motivo aparente, a tristeza pode ser por nós mesmos ou pelas dores do mundo, pode advir de uma palavra ou de um gesto, mas que ela sempre aparece e devemos nos aprontar para recebê-la, porque existe uma alegria inesperada na tristeza, que vem do fato de ainda conseguirmos senti-la.

Pode parecer confuso mas é um alento. Olhe para o lado: estamos vivendo numa era em que pessoas matam em briga de trânsito, matam por um boné, matam para se divertir. Além disso, as pessoas estão sem dinheiro. Quem tem emprego, segura. Quem não tem, procura. Os que possuem um amor desconfiam até da própria sombra, já que há muita oferta de sexo no mercado. E a gente corre pra caramba, é escravo do relógio, não consegue mais ficar deitado numa rede, lendo um livro, ouvindo música. Há tanta coisa pra fazer que resta pouco tempo pra sentir.

Por isso, qualquer sentimento é bem-vindo, mesmo que não seja uma euforia, um gozo, um entusiasmo, mesmo que seja uma melancolia. Sentir é um verbo que se conjuga para dentro, ao contrário do fazer, que é conjugado pra fora.

Sentir alimenta, sentir ensina, sentir aquieta. Fazer é muito barulhento.

Sentir é um retiro, fazer é uma festa. O sentir não pode ser escutado, apenas auscultado. Sentir e fazer, ambos são necessários, mas só o fazer rende grana, contatos, diplomas, convites, aquisições. Até parece que sentir não serve para subir na vida.

Uma pessoa triste é evitada. Não cabe no mundo da propaganda dos cremes dentais, dos pagodes, dos carnavais. Tristeza parece praga, lepra, doença contagiosa, um estacionamento proibido. Ok, tristeza não faz realmente bem pra saúde, mas a introspecção é um recuo providencial, pois é quando silenciamos que melhor conversamos com nossos botões. E dessa conversa sai luz, lições, sinais, e a tristeza acaba saindo também, dando espaço para uma alegria nova e revitalizada. Triste é não sentir nada.

Martha Medeiros

7 comentários:

  1. Olá Zélia,obrigado pela visita e comentário.Gostei deste teu Mundo,voltarei sempre que possivel.Beijos.

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  2. Concordo em gênero, número e grau: triste é não ter pelo que lutar, se inquietar. Isso sim, é uma tristeza que só tem fim até que a vida vire o jogo. Pelo avesso!
    Beijoca, flor.

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  3. Gosto dos textos da Marta Medeiros, pela sua lucidez e senso crítico. É a pura verdade: desconfiamos, quando nos relacionamos, da própria sombra. Na verdade, vivemos inseguros em relação a tudo e a todos.
    Beijos!

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Sentir é um verbo que se conjuga para dentro, ao contrário do fazer, que é conjugado pra fora...

    Oi,Zélia
    Vim conhecê-la mais de perto e gostei muito das cores, das palavras, e desse texto que é um retrato bem triste do mundo contemporâneo.

    Voltarei com mais calma para lê-la no ontem, porque o hoje já me alimentou.

    Bjs.

    Desculpe-me ter removido a mensagem anterior, mas cometi um erro imperdoável de LP que não poderia permanecer.

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  6. Respiração

    Respiro.
    E sei,
    assim,
    Que já vieste!

    -Há uma rosa
    Na manhã agreste...

    Pedro Homem de Melo

    Deixo-te a ternura de um abraço.
    Helena

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  7. Zélia, teu blog é lindo!
    obrigada por seguir os meus.
    Beijos doces no teu coração poeta..

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